Universidade

De Enciclopédia Médica Moraes Amato
Ir para navegação Ir para pesquisar

O objetivo fundamental da Universidade é pensar. No encalço desse objetivo, ela tem condições de servir à sociedade e participar ativamente da vida, prestando seus serviços de maneira plena e eficaz. Ela deve ensinar, pesquisar e estar sempre voltada para a comunidade. Pelo ensino, a Universidade prepara homens, que dirigirão a Nação no dia de amanhã. No ensino apoiado na pesquisa ela encontra os subsídios para preparar o jovem para enfrentar os fatos do futuro ainda hoje imprevisíveis. Ela ensina o raciocínio científico. Ela ensina a contestar para encontrar a verdade e não para destruir o que está erguido. Na pesquisa ela encontra as soluções viáveis para os grandes problemas. Diante de encargos tão nobres, de reflexos imediatos e futuros, vê-se a importância de preservar a Universidade de tudo aquilo que possa afetar seu desempenho. A comunidade deve, ela também, utilizar dispositivos que a preservem. A Universidade brasileira não está, propriamente em Crise. Ela está sendo vítima de uma Crise que, no momento, aflige o Estado, A Nação e o Mundo. A situação atual, com seus reflexos econômicos e sociais, está afetando a todos e particularmente, à Universidade. Talvez a melhor Arma para sair mais facilmente da Crise que padecemos em decorrência da situação energética mundial, seja investir mais na Universidade. Problemas específicos, que ocasionalmente são suficientes para agitar o jovem estudante e, outros que muitas vezes transcendem os limites dos campi da Universidade nada mais são do que sinais e sintomas locais de Patologia geral. Como cada Órgão da economia humana responde maneira diferente ao mesmo estímulo também cada grupo dentro da Universidade – aluno, Professor e Funcionário – cada qual enxergando o problema pela sua ótica, responde ao mesmo estímulo de modo diferente. Cada um dentro de seus parâmetros. Todos, porém, com o melhor e mais elevado dos intuitos buscam, a seu modo, preservar o que há de mais nobre. Ninguém pode negar que, dentro da nação, é a Universidade que dispõe de maiores reservas intelectuais para encontrar alternativas viáveis para ajudar a Nação a sair da Crise. Na sociedade não há aglomerado tão grande, que reuna tantas cabeças pensantes e com visão tão diversificada, de maneira a representar uma esperança para soluções de problemas tão complexos como o do momento. Os sintomas que perturbam o bom funcionamento do conjunto, merecem, de per si, Atenção e soluções específicas, mesmo que parciais. Cabe, porém, aos Órgãos instituídos utilizar sua competência para fazer o Diagnóstico correto e a terapêutica adequada. A clínica muitas vezes utiliza a medicação sintomática para aliviar a dor ou minimizar um Sintoma sem, entretanto, curar a Doença. É um dos recursos que o médico usa para ajudar o doente esperar a Cura. Assim muitas soluções devem ser imediatas para resolver manifestações intercorrentes. Entretanto, o que realmente Cura o doente é a medicação etiológica. Tratar da Causa da Doença. Como o próprio organismo humano cuidado do cérebro, preservando-o, ao máximo, para evitar as lesões das suas células, cabe ao governo, com presteza, dar prioridade ao que a comunidade possui de mais nobre – a Universidade. (Ver: Cérebro)
___ (cursos e suas correlações), para ressaltar certas aberrações da estrutura acadêmica, deixando bem claro a posição ocupada pelos vários cursos oferecidos pela Universidade, e, particularmente, as Relações entre eles próprios, acredito ser oportuno apresentá-los em conjunto. A Universidade oferece os seguintes cursos: I. Graduação - a duração é variável como, por exemplo, medicina - 6 anos; direito, engenharia, agricultura, veterinária e Farmácia - 5 anos; Educação física, filosofia, letras, química, física, Enfermagem e Nutrição - 4 anos; II. Cursos de Pós-Graduação senso strito - em nível de mestrado de, no mínimo, 2 anos e Doutorado de, no mínimo, 3 anos em continuação ao mestrado ou em certos cursos não exigindo pré-requisito de mestrado. No Caso da medicina, o mestrado não é pré-requisito para o doutorado, mas exige porém, a Residência Médica de 3 anos como pré-requisito; III. Curso de Extensão Universitária - A Portaria de n° 3878, do Conselho Cultural e Extensão Universitária da Universidade de São Paulo, de 20/09/91, tratando dos cursos de extensão universitária, estabelece as seguintes modalidades: especialização, aperfeiçoamento, difusão cultural e outros.
a) Cursos de Especialização - de 360 horas e a Universidade pode oferecer esses cursos em todas as áreas com a duração de um ano. Pode ser de duas naturezas: Profissional e Científica, sendo a primeira a mais comum. Na medicina, na prática, sempre é exigida a Residência Médica como pré-requisito. Comentários - Os cursos mais curtos que a Universidade oferece dão duas oportunidades de mercado de Trabalho: como bacharel, o Indivíduo vai para a indústria ou serviços; ou para o ensino em nível secundário como Licenciado, e para tal é exigida a Licenciatura feita em um ano na Faculdade de Educação. A Pós-Graduação desse pessoal pode ser feita sem esse pré-requisito, o que possibilita obter o grau de Mestre após dois anos de Pós-Graduação e o de Doutor após mais três anos.
b) Curso de Aperfeiçoamento - é de, no mínimo, 180 horas, curso de maior e menor duração. Exige a Especialização como pré-requisito, e é de natureza profissional para a Especialização profissional; Científica, para a correspondente Especialização. Comentários - somente do médico, que já tem a carreira mais longa (6 anos), é que é exigido como pré-requisito no Mínimo três anos de Residência.
Assim, para conquistar o Doutorado o médico dispende quatorze anos, sendo seis de graduação, três de Residência Médica e cinco de doutorado, fazendo ou não o mestrado; o advogado, bem como o engenheiro, pode obter o doutorado em dez anos, sendo cinco de Graduação e cinco de pós, matriculando-se também diretamente no doutorado ou passando pelo mestrado. Os que diplomam em curso de quatro anos podem conquistar seu Título de Mestre em mais dois anos, e o Doutor em mais três além desses, no total de 9 anos.
c) Curso de Difusão Cultural - sem Limite Mínimo de carga horária. Nesta categoria estão reunidos todos os demais cursos que a Universidade oferece, para quem deseja aprimorar-se culturalmente no assunto de que o curso é objeto; é oferecido tanto para seus alunos dos vários níveis, bem como para a comunidade externa.
d) Outros cursos - sem Limite de carga horária e com denominação variada, como v.g. de reciclagem, de aprimoramento; contínuo, de verão, ou com qualquer outra denominação.
___, repensando a, agora, neste momentâneo retorno à casa paterna, implícito no título que ora se me concede, quero, como prova de fidelidade à oficina onde longos anos trabalhei, oferecer algumas reflexões sobre a Universidade, embora com Risco de parecer impertinente ou antiquado. Aparenta a Universidade defrontar-se com inquietantes sinais de cansaço, de recessão, ou de perplexidade, a par de desacertos em certas tendências. Decadência da Universidade? “Fala-se em decadência para estigmatizar mudanças de que discordamos”, escreve a historiadora Michelle Perrot. Não desejo cair nesse pecado, mas apenas questionar rumos que parecem pedir exame. A Universidade de São Paulo continua tão grande como o foi desde o nascedouro, e, havendo sabedoria, há de continuar, por infindo tempo ainda, a ser mais pujante das Universidades do País. Nós historiadores convivemos com as mudanças, às vezes aceleradas sob o nome de revolução, quando em nosso Colo são atiradas lascas do presente rejeitado e que logo viram passado, e somos obrigados a cuidar delas, ingredientes que passam a ser de nossa alquimia. Assim, tudo aquilo que aconteceu em 1968, passado que não se pode obliterar: Precipitação de uma torrente de mudanças nas interrelações sociais, nos costumes, nas hierarquias, nas filosofias de vida. Foi um abalo a partir do acampamento universitário, uma revolução ambígua que não chegou a dobrar as resistências, e acabaram filtrados seus radicalismos. Ante a contestação do que parecia paternalismo, reduziu-se para os professores sua força de ensinar em razão daquele tumultuado clamor de revisões. Há em todo o ensino um pressuposto de confiança, e um lastro de autoridade reconhecida; a crise, em contraste, impugnava todo o Sistema consagrado pelo tempo. Para o bem, para o mal? Tantos anos depois ainda não temos certezas; à ressaca, sucedeu a marola. Vinham do Exterior as mensagens reivindicatórias na linha da incurável propensão que temos em nosso colonialismo mental sempre recorrente, a perfilhar paródias de soluções alheias, a oferecer ressonâncias como se fossem músicas originais. No engano de que só progredimos imitando, trocamos, muita vez com inconseqüência, o acerto pela novidade importada, o genuíno pelo arremedo. É mais fácil e de menor Risco imitar do que criar. Há em toda imitação um contingente de Alienação. Talvez de preguiça, e de covardia também. Em todo Travesti há algo de ridículo que quase nunca percebemos. E resistir ao imitativismo não significa Xenofobia. Por Causa da refração das imagens na índole e na inteligibilidade do povo diferente, o que quase sempre resulta é caricatura, não retrato. Na história, os empréstimos de Bens culturais, “esses viajantes impenitentes” de que Fala Braudel ocorrem sempre e beneficiam os povos que os tomam. Helenizou-se o Mediterrâneo e a Europa Ocidental se romanizou. Aqueles povos porém construíram seus próprios padrões de cultura nacionais: as culturas nacionais européias. Assimilados, os empréstimos foram recondicionados conforme o gênio de cada povo. Não é desprezível a experiência dos mais cultos, mas se os termos dos problemas não coincidem, a Inteligência diz que as soluções são outras. Se da Sabedoria européia recebemos a Universidade, temos de ajustá-la à nossa mentalidade da qual somos reféns, bem como aos reclamos de nosso tempo, sem desnaturá-la. Nesse sentido, não havemos de mudar simplesmente porque outros mudaram; mudar só para melhor, ou por necessidade, e não apenas para decalcar modelos a pretexto de modernização. O moderno não é superior, por definição. Talvez pareça repassado de conservadorismo o que vamos dizer. Hoje em dia há mais ousadia em ser conservador do que em ser revolucionário. Não é fácil escolher o que preservar e o que alijar, sem esquecer que é do próprio destino do presente superar o passado. Ainda que prevenidos contra o misoneismo, nós historiadores, convivendo com o passado tendemos a estimá-lo e temos Pena de perdê-lo sem Remédio naquilo que possa ter tido de bom. Uma de nossas tarefas é lutar contra o esquecimento, e salvar a experiência dos antepassados justo a fim de prevenir retrocessos, e não para cimentar o imobilismo. Somos desajustados no Trato do presente. Maus políticos. Eu próprio, na juventude entrei na ante-sala da política, na Esquerda Democrática. A alegria durou pouco. Não passei da ante-sala: chocado com certas manobras, não tardei a desembarcar da política partidária, contentando-me com uma Cidadania discreta, tenteando convicções que não larguei. Quando ainda, tempos depois, se quis atrelar as liberdades universitárias ao carro dos césares nativos, amarrando-as às intolerâncias e “verdades” oficiais, discordei e preferi, ante a prepotência, abreviar meu mandato na direção da Faculdade a ceder, inconformado por deixar de servi-la o quanto pretendia. Renunciei, medroso de represálias que, por sorte minha não vieram. A seguir, quando, solidários, os alunos ameaçaram greve, tratei de dissuadi-los com temor de que a Escola viesse a ser fechada. Sabia de precedente, e já havia danos demais na docência e na discência. Ensaio e pesquisa – Preceitua-se na legislação, inclusive na triste Constituição que temos, a invocar esquisito Princípio de “indissociabilidade”, tríplice finalidade para a Universidade: ensino, pesquisa e extensão, entenda-se, de serviço à comunidade, trilogia tornada axiomática por força de repetição. Problema é o da proporção entre seus objetivos, quando, em verdade, o desiderato tem sido a formação de cidadãos capazes de bem servir à sociedade nos múltiplos campos do saber e da ação ligada ao saber; profissionais competentes, atualizados, dignos, armados de independência de espírito para superação das rotinas. São velhas as desavenças entre ensino e pesquisa. Já em 1919 Max Weber dizia, referindo-se ao jovem aspirante da carreira acadêmica: “Ele deve ter qualificações não só como pesquisador mas também como Professor. Estas duas coisas não são nem idênticas, nem inseparáveis, alguém pode ser muito destacado em pesquisa e lamentável como professor”. E citava ninguém menos que Leopold Ranke, o grande Historiador. Perigoso é o descompasso entre a Transmissão do já sabido e a geração de novos saberes. Situam-se os avanços do conhecimento quase sempre na fronteira entre o conhecimento e o desconhecido: para chegar-se à fronteira é preciso atravessar o campo do conhecido. Em outras palavras, para sucesso da pesquisa é preciso o ensino da ciência feita, a Transmissão do patrimônio consolidado. A nociva pendência entre a dedicação alternativa ao ensino ou à pesquisa vem sendo resolvida em favor da pesquisa. Esta preferência estimula o desencanto do magistério e agrava a Distrofia do ofício do Professor ao descaraterizar-se a Universidade como agência social de preparo de gerações para a vida profissional e da cultura. Já há quem a anteveja mutilada pela desescolarização e transmudada em merencória galeria de laboratórios. Quando, com vistas às carreiras busca-se apreciar o desempenho do Professor tão somente pelo balanço da assiduidade na pesquisa real ou encenada, deprecia-se a Parte do ensino. E quando, na linha de uma persistente Anemia da confiança, se cogita de vigiar também a atividade docente, imagina-se entregar sua apreciação a alunos, criando-se pernicioso Nexo de Dependência em relação a eles, cujos juízos, dado seu despreparo podem refugir à imparcialidade; bons professores, porque exigentes, tornam-se impopulares, e as lideranças estudantis podem caprichar naturalmente em trabalhar as opiniões. Mais seriam medidas as afinidades que as qualidades de Professor. Há, dentro da Universidade, predisposição endêmica ao reformismo, espécie de exaustão das estruturas desgastadas, anseio de modernização a qualquer preço, não raro sem o balanço prévio das falhas porventura existentes. Nesse clima de Lassitude e de insatisfações, delineiam-se confrontos: da pesquisa contra a formação profissional, de cientistas contra humanistas, de burocratas contra docentes, de alunos contra professores. Prevenções mútuas que comprometem a sinergia do Trabalho e se alongam em reivindicações sempre renascentes de partilha do poder, quando o desafio não é mandar, é servir. Quando funcionários e alunos pleiteiam maior presença nos colegiados, insinuam que não confiam na lealdade e no discernimento dos professores. A fórmula da equalização de desiguais, do paritarismo boliviano, sob a Aparência de avanço democrático esconde a denegação da precedência do mérito, critério que deve presidir os destinos da Universidade onde, o que mais conta é o saber e a sinceridade de propósitos. De coloração populista, o reclamo de co-gestão constrange o Princípio de hierarquia cultural que, nem de longe, colide com os ideais democráticos, e que legitima a carreira universitária com o pressuposto de igualdade de oportunidade. Triste, se essa destinação apenas encobrisse vaidades ou ambições mal contidas. Populismo e democracia não se confundem, nem Tolerância e concessividade. Liberdade e Responsabilidade – Dois são os requisitos vitais da Persistência da grandeza da Universidade: Liberdade e Responsabilidade. Lição de Bertrand Russel. “A Liberdade carrega consigo a Responsabilidade e porisso muita gente a teme”. O saber novo que se procura só germina no chão da liberdade, no livre debate das idéias, o clima das mudanças sem angústias. Para preservar-se a Liberdade cumpre zelar-se pela Liberdade de todos. Somente a atmosfera de Liberdade de expressão de pensamento e de ação permite formar homens livres que um dia cheguem a ser sábios. A autocracia, qualquer que seja a sua Face começa por inibir e acaba por esterilizar. Todo dogmatismo oficial Anestesia a Inteligência ao impor certezas gratuitas. Proíbe a volúpia dos testes que consagram as hipóteses, e a gravação de evidência legítimas que a desmobilizam, uma vez alcançadas. Sensível à problemática do seu tempo, não pode a Universidade isolar-se, esquivando-se à procura das soluções. Porém, quando com suas paixões, apossa-se dos juízos, a política partidária gera sectarismos, e esse tirano das consciências que é a intolerância, denegação da Liberdade do outro, a crestar a objetividade da crítica e dos critérios de julgamento, deformando opiniões e aconselhando injustiças. Tem-se que vacinar os quadros universitários contra o mal de facciosismos, venha da Direita ou da Esquerda, dos porões ou das coberturas, da prepotência ou da astúcia. Se, refletindo sobre os problemas da sociedade, tem o Professor que ser político, a politização da Universidade não implica em enfeudação a quaisquer partidarismos. Sem corporativismo, sem clientelismos, sem nepotismos, sendo de todos, deixará servir sem estorvos nem bloqueios mentais a entravar a crítica e as definições. Dieta de persuasão e não de imposições de qualquer natureza. A reflexão sobre o uso da Liberdade desperta a ponderação dos limites da militância política com eventuais imposições de peias ideológicas a constranger convicções ou a condicionar a partilha das posições de comando. Conhecimento das correntes políticas é dever de Cidadania. A própria instituição delas depende, mas Dependência não implica em que deva ser enredada em seus caprichos e pressões. Embora sofra por vezes o assédio de ideologias mais insistentes, não se destina a servir de parque de manobras de quaisquer partidos, grupos ou facções. Sob a Forma de convicções pessoais, opções políticas ou filosóficas são sempre presentes, mas, por muito sinceras que sejam não devem ser intrometer como imposições no dia-a-dia do Trabalho. Cultivar-se a Liberdade é fundamental, mas é imperativo vigiar-se o uso que se faz dessa Liberdade. Liberdade de escolher as próprias idéias e expô-las, mas não de abafar idéias diferentes. De nada vale a Liberdade sem independência de espírito e fidelidade aos conhecimentos adquiridos. No campo discente, a democracia há de ser principalmente social, em vez de meramente política nessa insistência em participar de Órgãos de governo. O tema das reivindicações há de girar em torno da igualdade de oportunidade de estudo. De múltipla Forma pode-se propiciar essa igualdade: bolsas de estudo, monitorias e estágios remunerados, estudo alternado com trabalho, empregos temporários, regime especiais de freqüência, matrícula excepcional por disciplina, cursos noturnos de intensidade atenuada, Assistência à saúde, jurídica, psicológica, Assistência bibliográfica e laboratorial, moradia e transporte, isenções de taxas eventuais. Muito há que se fazer para equiparação de oportunidades, sendo como são díspares as condições de estudo Face às desigualdades sócio-econômicas. As entidades dos estudantes têm que participar desses serviços a fim de comedir-se a burocracia e prevenirem-se distorções. Tendem a crescer as induções de natureza político-partidária com a onda de electivismo de extração populista que, a pretexto de democratização, infestou o Processo de composição dos quadros diretivos, às vezes com desapreço das credenciais universitárias detraídas em favor de consertos extra-universitários. Nas grandes crises nacionais, em momentos decisivos, a Universidade como um todo não pode marginalizar-se politicamente. Também não pode manter-se alheia aos problemas da coletividade, com as desigualdades, a má distribuição das rendas, o desemprego, o desequilíbrio ecológico, o subdesenvolvimento, a rudeza dos costumes, a Dependência tecnológica, e tantos mais, encastelando-se em intelectualismos que a apartem da realidade social a que se propõe servir. Tem-se que pensar em uma revolução intelectual e moral que libere os valores fundamentais porventura anestesiados pelos exageros do utilitarismo e do racionalismo onipresentes. Indesejável é o transplante de rivalidades que geram animosidade, conflitos, desrespeito à autonomia dos espíritos, a poluir-se um ambiente, que é de estudo e reflexão, com sectarismos, quando enliços partidários chegam a contaminar os critérios de julgamento e de conduta, impondo parcialidades não raro dissimuladas sob desculpa de decorrências de princípios. Também a Universidade não é uma ilha banhada de presunção, de vaidades, de auto-suficiência: verte seu saber, mas busca o saber exterior. Para o bem comum, os conhecimentos têm de circular sem reservas, sem exclusões. A Universidade ensina Política, mas nem porisso há de patinar nos humores da política partidária, nem, ao estudar as ideologias de todos os tempos, há de consentir que, com sua convivência, uma delas chegue a enxotar as demais correntes. Mais séria é a contingência de defesa da Universidade contra as insídias provindas do exterior, os atropelos da Liberdade por Parte de autocracias emergentes, quando governos que a subsidiam intentam, nos colapsos da democracia, impor-lhe rumos exclusivos, e dar-lhe a tonalidade cultural de seu gosto ou conveniência, tornando-a Instrumento de seus desígnios. Resta então à Universidade a recusa, e unir-se com determinação para proteção da Liberdade recalcada, ou seja, da condição essencial de sua razão de ser. Sem devoção à liberdade, estiola-se a criatividade, intimida-se a crítica e a aventura do espírito. Havemos de resguardar, inclusive a terrível Liberdade de errar, quando o Erro do momento é dissenção, e a dissenção pode levar ao encontro de verdades arredias. Pensemos em Galileu. Em heresias que se transmudaram em religiões. Afinidades de idéias que suscitam a formação de escolas, constelações de mestres e discípulos não são depreciáveis, desde que não persigam com dogmatismo as opiniões divergentes. Ao Direito da Liberdade associa-se o ônus da Responsabilidade. Quase sozinho defendi outrora, como ainda hoje, a Persistência do catedrático que, com a Lei de Bases e Diretrizes, com a Universidade de Brasília em 1951, e com a famosa Lei 5.540 foi exilado do panteon universitário como anjo mau decaído. O Estatuto de 1969 trocou-o pela figura do Professor titular, implantou os departamentos, e, obviamente, não se pensou mais em Liberdade de cátedra e suas garantias. Longe o tempo em que professores se equiparavam a juízes. Sou dos derradeiros catedráticos sobreviventes, e nenhum remorso sinto de ter sido catedrático. Pelo contrário, orgulho-me dessa condição, como sinto respeito pelos catedráticos que foram meus professores e colegas. Continuo a acreditar nos méritos da cátedra bem maiores que seus defeitos, pois que estes existem, inteiramente sanáveis. Os sucessores diminuídos, os titulares, perdoem-me, são catedráticos aguados, generais sem comando. O grande merecimento da cátedra, apesar de um incômodo traço de patrimonialidade que, associado à amplitude da autoridade, pode eventualmente chegar a desnaturá-la em nepotismos, estagnações, exclusivismos é a configuração da plenitude da responsabilidade, dessa Responsabilidade inteiriça que parece, a mais e mais, atenuar-se em todos os níveis da carreira. Respondia o catedrático por si e por sua equipe, e nesta, cada um era responsável perante ele. Havia um liame, hoje esgarçado – a confiança. Na Ausência de censura, de nada adianta a Liberdade se não é usada para Benefício da cultura para as investidas da crítica e da criatividade. A Liberdade sem a Responsabilidade paralela, porém, convida à displicência. A Adoção dos Departamentos não veio acrescer o sendo de Responsabilidade. Ao suceder às cátedras, o Departamento, com seu Conselho e suas Comissões não se ofereceu como unidade de ensino e de pesquisa; perdido o horizonte dos problemas do dia-a-dia do ensino, transformou-se em Instância político-administrativa. Ao contrário do que se podia esperar, acentuou-se o individualismo, a auto-suficiência, distanciando-se seus membros do empenho de atuação coletiva. Desprezado o critério da antigüidade, afrouxada a hierarquia, desandou-se na corrida para os títulos, e sem a mediação do catedrático para cadenciar as etapas, esvai-se a devoção à docência, aos alunos. O Chefe do Departamento, esse cripto-catedrático eletivo, sempre na Dependência de um conselho, e responsável pela execução de medidas que não decide, absorvido por questões de ordem burocrática, vive à Margem do que se passa nas classes; nem os professores sentem-se responsáveis diante dele. Não tira sua autoridade, nem de sua posição de precedência na carreira, nem de delegação de autoridade Superior que o prestigie com sua confiança, mas de um mandato ocasional, e vive a debater-se em meio à trama de influências da Parte dos membros do Departamento. Massificação e Colegialidade – Dois aspectos da conjuntura atual levam a suscitar, a pretexto de democratização, a dissipação das responsabilidades: a massificação e o exagero da colegialidade. A massificação do quadro discente tende a afogar as individualidades, quando cada um, sentindo-se desconhecido é levado a abandonar-se no anonimato que parece eximi-lo de Responder perante alguém por seus atos e opiniões. Nessas condições, cresce o distanciamento entre professores e alunos. Também a docência é afetada pela massificação. A procura dos títulos a mais e mais expostos ao Risco da banalização acarreta sua desvalorização em uma espécie de Inflamação difusa a afiançar carreiras temporãs. Em decorrência desenvolve-se uma Crise de hierarquia pela confusão de níveis outrora bem demarcados pelo respeito à Maturidade e à experiência. As diferenças nas etapas da carreira eram funcionais como discrime de atribuições e responsabilidade, agora, parecem coincidir apenas com a Gradação das remunerações. Enreda-se o “cursus honorem” uma enfiada de títulos, alguns não raros arranjados lá fora sem controle, outros depreciados aqui dentro, complicando-se à toa uma hierarquia cada vez menos funcional. Mestre era alguém que sabia muito mais que os outros, possuidor de discípulos, independente de titulação. Agora é um título no papel, rés-do-chão do começo de carreira, muita vez embasada em uma incerta micro-expecialização prematura. Descaracterizou-se a figura do Assistente: não assiste a mais ninguém e ignora aquela expressiva Função de mediação entre o Professor e o aluno dos quais em razão da idade, achava-se sempre mais perto. Também o Auxiliar de ensino tem sua própria órbita, e a ninguém cuida de Auxiliar. Liga-se ao problema da Responsabilidade a Restauração da hierarquia do saber pela reposição da justa distância que deve existir entre o patamar de quem já sabe, e o de quem ainda não sabe o bastante. E, nesta linha, impõe-se o reaverem-se as garantias da Liberdade de cátedra tão atropeladas em outros tempos; a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos, tolhidas em desprestígio do magistério, e nunca restituídas. Eram garantias de independência, e de consagração à verdade. Não eram privilégios. Equiparavam-se então os professores aos juízes. Os exageros de colegialidade, excesso de conselhos, comissões, coordenadorias, grupos de trabalho, núcleos de apoio, na medida em que afrouxam a iniciativa e o comando individual, embarançam as atividades universitárias. Conselhos e Comissões há na Reitoria mais de vinte a ocupar professores e funcionários, e a debilitar a autoridade do Reitor. As buscas de definições coletivas não raro geram dissenções estéreis ao pretender-se erigir em princípios o que são muitas vezes simples coincidências de opiniões ocasionais. E a Responsabilidade coletiva por sua natureza, esquiva-se a toda a apuração concreta. A multiplicidade de Órgãos pluralizados, acumulando quase sempre atribuições consultivas e deliberativas, amparadas no pressuposto de que as maiorias estão sempre com a razão, além de atenuar responsabilidades, agrave os males da burocratização e sofreia o andamento das providências. Não são de todo prescindíveis na medida em que retêm o mérito de propiciar o confronto de soluções, desarmando imposições eventuais, e de estimular solidariedades em programas comuns, razão para a manutenção de alguns deles desde que com interferências delimitadas, para que nunca retardem as instâncias de execução. Aquela definida Responsabilidade que detinham os catedráticos com Poder de escolher, de dispensar, de ordenar, de orientar, de corrigir desvios ou discórdias, diluiu-se na revoada festiva aos Órgãos plurais onde ninguém é totalmente responsável, sendo cada Membro apenas um voto, uma fração de decisão, às vezes mero Acompanhante de escassas convicções. Não há muito, li que um camelo é um cavalo que foi feito por uma comissão. Inventa-se uma comissão quando não se quer, não se sabe ou se teme decidir. Contudo, em clima democrático, Órgãos coletivos de consulta podem ser indispensáveis: a nobreza das Congregações ao longo tempo de sua existência e confirmação de sua imprescindibilidade. Forçoso porém é recuperar-se o senso da Responsabilidade individual que advém da Consciência do dever, este fugidío imperativo ético, quando a legislação timbra em alinhar direitos e privilégios, e em omitir a enunciação dos deveres de cada um no desempenho das funções. Aos docentes, se publicam alguma coisa, ninguém os inquietará, e eventuais queixas dos alunos descairão no esquecimento. Quando falamos na redefinição das responsabilidades, em uma renovada Consciência dos deveres profissionais, não cogitamos dessa prática chamada Avaliação, inovação burocratizante ofensiva aos brios do Professor. Esta polícia quantifica a produção impressa, mas não torna melhores os professores. Justo quanto menos se quer apreciar o preparo dos alunos, refugando-se as reprovações, ora menos temidas por eles que pelos examinadores medrosos de impopularidade, mais se insiste em sujeitar os professores à reprovação por não haverem publicado uns artigos apressados bons para nutrir quantificações estatísticas, com Base na leviana presunção de que trabalhos acadêmicos devam ser consumados contra relógio sob Cominação de prazos burocráticos. Obsessão de produtividade com o fito de indenizarem-se investimentos. Coincidência, a implementação das avaliações a partir do tempo em que cresceram os financiamentos da pesquisa? As expectativas da tecnologia agradam a mentalidade utilitária sempre alerta em nosso de redor. Agrava-se a ofensa subjacente ao convocarem-se avaliadores fora dos quadros da Universidade, na suspeita de que juízos destes não merecem confiança. Valia bem mais aquela discreta vigilância por Parte dos mais experientes, feita de conselho, de crítica, de sugestões, e, sobretudo, de simpatia humana. Impõe-se reencontrar-se, com a estrutural moral indene, a figura do professor, e não apenas a presença do pesquisador intimado, às voltas com seus aparelhos e suas fichas, a interporem-se entre eles e seus indesejados aprendizes. Ciência e HumanismoSinal dos tempos, pode-se entrever na Universidade, crescente desequilíbrio na partilha dos domínios culturais. Desmesurou-se o espaço da Ciências Naturais e Exatas e suas proporções tencológicas, com a conseqüente recuo das disciplinas humanísticas, priorizando-se as Ciências às expensas de valores éticos e estéticos. Rarefazem-se os Cuidados com a formação do Caráter do homem tão estimados no passado, agora cada vez mais acossados pelo inchume do cientificismo e do utilitarismo a ele inerente. Passou-se à submissão a uma racionalidade intransigente, como se só com o conhecimento objetivo sobre as coisas se saciasse o espírito humano contente com o progressivo domínio do meio material em que vive. O Preceito de objetividade científica proíbe a imaginação inventiva, esquecido de que tudo o que se busca comprovar foi primeiro imaginado como hipótese. Urge repensar-se, para o bem dos espíritos, que o conhecimento da realidade material não é o bastante para as precisões do ser no mundo. Mais que tudo somos feixes de instintos, de sentimentos, de emoções, atividades psíquicas muito mais assíduas em nosso proceder. As descobertas das Ciências da Natureza, por mais importantes que sejam nem de longe suprem todos os desígnios da existência humana. Carecemos de crenças, de sonhos, de mitos, de desejos, de estesias, de utopias e ucronias, de esperanças que geram energias para viver, e sobretudo, de princípios que norteiam o exercício da vontade. Não prescindimos de imagens, de significados, de abstrações, de parcialidades inexplicadas. Não responde a Universidade sozinha por tudo isso, é claro, mas por certo não pode fazer de conta que não são seus problemas da vida interior, da vida em sua inteireza que exige muito mais que o conforto e a segurança Materiais desvendados a partir dos laboratórios. A retração do cuidado com a totalidade do humano suscita uma coisificação da cultura quando o saber das coisas confisca o saber do homem sobre seu próprio ser e seu destino. Vale lembrar o que escreveu o Historiador Huizinga em seu livro Entre as sombras do amanhã: “A ciência sem o freio de um Princípio Superior entrega em seguida seus segredos à Técnica que se orienta em Sentido mercantil; e a Técnica por sua vez, menos freada ainda por princípios superiores de cultura cria com os meios da Ciência todos os instrumentos que o organismo do Poder dela reclama”. A mesma Ciência de Sabin e de Fleming inventa e aperfeiçoa os mísseis de Oberth e Von Braun, e a Guerra química, ou a bomba atômica de Oppenheimer e Fermi, frutos de laboratório. A diferença entre o bem e o mal não é dada pela experimentação científica. Só o conhecimento do Universo dos valores pode traçar o Limite da ação: o que deve e o que não deve ser feito. A indiferença Ética do cientismo mais e mais acorrenta a Universidade ao crescente jugo do racionalismo. Ainda lição de Huizanga: “Há muito tempo que todos sem exceção nos emancipamos do racionalismo tirânico. Sabemos que nem tudo se pode medir com o critério da racionalidade. O próprio pensamento progressivo nos ensina que a razão por si só não basta”. Impõe-se a ponderar a diferença que existe entre o pensamento e a existência, entre o conhecer e o ser, diferença que, embora sirva a ambos, a Ciência mal cogita. Não se trata contudo de suscitar submissão da vontade ao domínio dos impulsos menos racionais da mente. Considerando a integridade do ser humano, o que se pede à Universidade é o reeqüilíbrio e a Articulação enter a busca do conhecimento da natureza e a do conhecimento do homem. Da preferência pelo estudo das coisas resulta a Anemia do Humanismo impelido para a periferia das preocupações acadêmicas. Impõe-se a revalorização do homem como polo das inquietações do espírito, e não relegado à retaguarda do saber. As Faculdades de filosofia e suas afins não podem ser inferiorizadas, rendidas ao cientificismo irremitente e dominador que, alastrando-se, Ameaça desnaturar o ensino médio. Hierático, ensimesmado, o cientismo elimina do Ambiente o humor, a ironia, a malícia e a própria alegria de viver. Persuasivo, o cientificismo acoberta o utilitarismo servindo à Tecnologia que, por sua vez, acena com a perspectiva de melhoria da Qualidade de vida, de vida material, entenda-se. Esta convergência porém não mostra o que são os ideais de justiça, de compreensão humana ou de bondade, este Impulso constante de ajuda ao outro. Na sua inópia de princípios o cientificismo não censura os males da violência, nem se obriga a apadrinhar a promoção do bem comum. Sequer cogita da distância que existe entre o fabricar-se a bomba atômica e o atirá-lo sobre uma cidade desarmada. Sozinha, a Ciência não constrói um mundo melhor. Ao subestimar a reflexão sobre o humano, ao desprezar a introspeção, e alheio aos valores éticos, o laboratório, cuja potencialidade aumenta superlativamente cada dia não acha caminhos para a Erradicação da pobreza unida à ignorância, o invicto desafio nacional. Não se trata de modismo retórico, mas de repensar-se o papel da Universidade contemporânea no reencontro da perdida consonância entre as áreas do conhecimento. [Eduardo d’Oliveira França]