Biólogos em Física e Físicos em Biologia

Vários fisiologistas contribuiram com importantíssimas descobertas ou invenções no campo da Física. O médico Luigi Galvani, ao descobrir os fenômenos elétricos dos organismos, inventou instrumentos de medida e sem o querer induziu Alessandro Volta, físico, a inventar a pilha, sem a qual grande fração da tecnologia moderna não existiria. Não seriam viáveis os motores a explosão, e portanto os automóveis, aviões e similares, a eletrônica no começo deste século, alta fração da eletrônica moderna, a telefonia, e portanto os meios de telecomunicação, os computadores e os circuitos integrados e as naves espaciais seriam impossíveis. Matteucci, médico, inventou na primeira metade do século passado o multímetro (que mede voltagens, resistências, correntes, capacitâncias, indutâncias). Von Helmholtz, na segunda metade do século 19, era cirurgião militar, depois tornou-se fisiologista, dos mais importantes de todos os tempos, e por fim Professor de Física da mais cobiçada cátedra de Física do mundo em sua época, a da Universidade de Berlim. Helmholtz, que fez importantíssimas descobertas sobre a fisiologia visual e auditiva e o balanço energético no organismo animal, foi o primeiro a medir a velocidade de propagação dos impulsos nervosos, inventou o primeiro termômetro de alta Sensibilidade (par termoelétrico que lhe permitia medir décimos de grau) e o oftalmoscópio e foi um dos criadores da Termodinâmica. Seu discípulo Heinrich Hertz descobriu as ondas de rádio, cuja importância em ciência e em tecnologia é desnecessário ressaltar. É antiga a fascinação que a Física exerce sobre os Médicos. Copérnico, que estruturou matematicamente a teoria heliocêntrica do Sistema solar, era médico, assim como von Helmholtz. Robert Meyer, outro dos fundadores da Termodinâmica, também era médico; conta-se que suas idéias sobre o Calor em Física nasceram quando era médico de um navio que viajava pelo Oceano Pacífico no começo do século passado e meditava sobre as necessidades de certos tipos de Alimento em ambientes muito quentes. A tendência inversa, isto é, a contribuição direta de Físicos para a Fisiologia e a Medicina era incipiente até início do século 20, quando começou a tornar-se significativa. Von Békesy, físico húngaro que pesquisava nas Indústrias Siemens, em Berlim, esclareceu os mecanismos de estimulação das células ciliadas do Ouvido Interno. Outro físico húngaro, Von Hévesy, trabalhando em Estocolmo, escondido da II Guerra Mundial, iniciou o uso de Radioisótopos em Biologia. O físico Konrad Röntgen, descobridor da Radiação que ele denominou raios-X, inventou também sua aplicação médica ao radiografar uma das mãos de sua esposa, inaugurando a Disciplina de Radiologia, de tanta relevância médica em nossos tempos. Hodgkins, físico bitânico que participou da invenção do radar durante a Segunda Guerra Mundial, descreveu com Huxley os mecanismos do potencial de membrana e do potencial de ação. É imensa a atração que a fisiologia do Sistema nervoso exerce atualmente sobre Físicos e matemáticos. E vale lembrar também que a idéia do código Genético foi aventada por dois grandes físicos, o austríaco Erwin Schrödinger e o russo George Gamow. E a demonstração experimental da dupla Hélice foi obra de uma física inglesa, Rosalind Franklin, cujo nome foi apagado da História da descoberta do código Genético. Watson e Crick, que ficaram sozinhos com a glória, insistiam com ela que a Hélice era tríplice enquanto ela, que realizou todo o estudo cristalográfico do DNA, teimava que era dupla... Já no século XVIII dois importantes matemáticos e físicos, Laplace e Lagrange, associaram-se a Lavoisier para explicar a respiração. Lavoisier descobrira o Processo de oxidação (ou combustão animal, como ele a chamava) como fundamento principal da respiração. Lavoisier e Laplace supunham que a combustão ocorria nos pulmões, sobretudo no intervalo entre a inspiração e a expiração, mas sabiam que essa explicação não era muito convincente. Seu contemporâneo Lagrange deduziu que se a oxidação se desse só nos Pulmões estes se incendiariam, tal seria a concentração de calor, incompatível com a própria existência dos Pulmões. Lagrange aventou a hipótese, que depois se provou ser correta, de que a troca de O2 por CO2 se dava nos Pulmões mas a oxidação ocorria em todos os tecidos de um organismo, sem dúvida um das grandes descobertas da Biologia. Se uma Pessoa fosse reduzida ao tamanho do filamento de uma lâmpada, o Calor por ela produzido acenderia a luz com a potência de cerca de 100 Watts. Essa incursão de Lagrange nos páramos da Fisiologia não era, entretanto, fortuita; ele lia rotineiramente livros de Biologia quando se enfastiava com a Matemática, o que lhe permitiu, de fato, resolver um problema crucial da Biologia ao mesmo tempo em que resolvia problemas de Matemática e de Astronomia. Lagrange teve uma vida interessante e aventureira. Nascido na Itália, onde passou sua Infância e juventude e estudou Matemática, foi para a Alemanha, país em que viveu quase 30 anos, e finalmente deslocou-se para Paris, onde fez grandes descobertas em Matemática e Astronomia e resolveu o magno problema da respiração nos tecidos. César Timo-Iaria